quinta-feira, 30 de julho de 2009

Carlota

A noite cobria com seu manto sua casa
O relógio bate duas da manhã
Ele se levanta assustado
Deitou-se as seis,
no entanto, ainda sim, não era tempo de acordar

Poucos segundos se passaram até a lembrança reviver,
a angústia o acordara
Desejava febrilmente sentir aquele calafrio
companheiro da noite no Salão

Encheu a banheira
Organizou três sacas de gelo picado,
lançando-as consecutivamente no banho
Despiu-se, sentou-se e assim ficou um bom tempo
Quando percebeu que já não sentia tanto frio
abandonou o banho e parou no sobrando

O vento gélido da madrugada percorria seu corpo molhado
Então vieram crescentes
Um,
Dois,
Três calafrios
Mas nenhum comparado ao do Salão

Voltou ao banheiro
Tentaria mais uma vez
Ligou o chuveiro com água quente,
lançou-se de baixo

A princípio um leve tremor,
todavia, a água quente só lhe deu esse de bom grado
Em seguida, cobriu-lhe com um manto de ternura,
ele aproveitou esse deleite

Desistiu
Não conseguiria tal sensação em sua casa
Só havia um porquê.
Aceitou o veredicto enquanto se arrumava
Os calafrios eram produzidos pela lembrança
da morena com quem dançou no Salão
Não eram calafrios comuns

Sorrindo,
elegantemente vestido
foi tragado pela morena imagem até o Salão
onde a Milonga o concederia o mundo necessário
para acalentar seus desejos



VARCELLY


terça-feira, 28 de julho de 2009

Taco

Taco, espelhos, paredes, barras de ferros envolta do Salão, teto, todos estavam ali presenciando o encontro. Passos no corredor, alguém sobe a escada. Do lado oposto a porta de entrada havia outras três de vidro que davam acesso ao sobrado. Esse feito também de madeiras e com grades sutilmente desenhadas, repletas de nuançais e floreios. Era no sobrado que ela estava quando percebeu a presença dele. A brisa corria leve, movendo os cabelos longos e cacheados da senhorita, que no seu vestido longo e sobre seu fino salto olhava para a porta onde agora sorria um homem.

Ele não havia ingerido se quer uma gota de álcool, no entanto, a beleza da senhorita o tinha deslocado da sua sobriedade e via agora três dela, uma para cada porta. Assim que abandonou o concreto rígido da escada e acomodou a sola de seus sapatos no taco, com um som tradicional desse gesto, iniciou-se a música. Trouxe o outro pé para dentro da atmosfera do Salão, ajeitou o terno, encaixando-o melhor no corpo, e retirou o chapéu, que inicialmente lhe acobertava as feições.

Elas riam dessa ritual preparatório e adoravam poder analisá-lo como a um filme, desde a entrada na sala até a retirada do chapéu. Ele fazia tudo seguindo o ritmo suave da música, como se tivesse passado a vida inteira ouvindo-a. A música parecia tê-lo obrigado a desistir de caminhar até as moças, deslizava ora para frente ora para trás e seus sapatos pararam de produzir o típico som do encontro com o taco como fora na entrada. Movia pés, pernas, quadril e tronco em movimentos simples, mas detentores de uma graça aterradora que comovera as senhoritas.

Ele apenas se movia na direção do final do Salão admirando as imagens de lá emitidas. Não pensou em impressionar ou conquistar as moças com seus movimentos, porém, apreciava os sorrisos que causavam. E assim, foi vencendo a distância que o separava do sobrado e tendo que se apressar para escolher uma das três donzelas para acompanhá-lo na próxima dança. Olhou indeciso para as três portas e decidiu entrar onde seus passos o levassem. Fechou os olhos e dançou o resto da música. Após alguns giros já não tinha mais consciência da direção que se deslocava.

Silêncio. A música acabou. Ele abriu os olhos e vira as três portas estampando a realidade, só existia uma moça em sua frente. Adentrou o sobrado, olhou-a demoradamente, como se repetisse o tempo de observação que ela teve desde que ele entrou no Salão. Sua beleza era impressionante, era como os passos dele, simples, mas sublime. Ela parecia adorar aquela situação, não se incomodava de ficar parada posando para um olhar tão entusiasmado como aquele.

Não dissera uma palavra, estendeu a mão e ela aceitou o convite. Entraram no Salão ao som do taco sob seus pés. Mãos unidas. O braço dele a envolvia pela cintura e o dela pousara-lhe sobre os ombros. Eles se encaravam profundamente. A música já começava, todavia, a movimentação não. Eles preferiram sentir o prazer da presença do corpo um do outro. Dançavam parados! O cheiro dela, a textura do vestido aquecido pelo corpo, as pernas encostadas e lábios ansiando o fim da dança com uma respiração ofegante. Ela sentia os ombros e as costas dele com o braço, a textura da pele da mão dele, a firmeza com que ele a segurava pela cintura. Ela também não queria se mover.



VARCELLY


quinta-feira, 23 de julho de 2009

Visitas inesperadas

Sou forte e inabalável pela Saudade. Esse era meu grito de guerra há pouco tempo atrás. Dizia muito honrado de minha segurança, que desconhecia tal sentimento, pois sempre o driblava. Se alguém desaparecia ou se ausentava de minha vida, em pouco tempo, eu esquecia e continuava normalmente os dias. Ia aos mesmos lugares sem fantasmas, falava dos ausentes sem gaguejar, ou seja, tirava de letra.

No entanto, há pouco tempo a conheci pelos abraços de uma Morena. Primeiro, só a Morena possuía abraços reconfortantes e destruidores de todo o mal. Não importava se o seu mal-estar era de saúde, psicológico ou financeiro, ela lhe envolvia com tamanho carinho e suavidade que chegava a ser amnésico. O seu golpe fatal, porém, ainda estava por vir, o sorriso. Ambos, quando juntos, derrubavam qualquer marmanjo autoproclamado resistente às conseqüências duradouras das carícias de uma mulher.

Essa semana, ela me pegou nos braços e sorriu me olhando nos olhos. Logo em seguida, riu da minha cara de bobo. Era uma manhã como outro qualquer, mas as lembranças da casa ainda estão todas estampadas em minha memória. O lençol enrugado pelo nosso peso, as janelas entreabertas com as cortinas bloqueando a entrada de luz e o corpo dela pesando em cima do meu. Não sei se havia uma música ambiente ou se essa era efeito da beleza do sorriso dela. O sol raiava, todavia, eu desejava a cada lance de luz que fosse a noite mais densa e negra só para tê-la em meus braços por mais tempo.

Tudo assim se deu e foi maravilhoso. No entanto, na manhã seguinte, ela me informou que iria viajar e permanecer fora por um final de semana inteiro. No começo, com meu ceticismo, duvidei da força das marcas deixadas em minhas costas e memória. Trocamos um último beijo e ela partiu. Juntamente com o desaparecimento do carro na primeira curva da minha rua fora meu ceticismo.
Fechei a porta e me preparei para vencer o percurso até meu quarto, alguém bateu na porta antes disso. Virei sorrindo, só podia ser ela desistindo de viajar ou voltando para pegar algo. Enganei-me! Era uma senhora vestida com cores mornas, roupas surradas, com um sorriso amarelo no rosto e detentora de um caminhar lento e cansado. Ela conferiu meu sorriso, que já havia se transformado numa interrogação, e disse: vim passar uns tempos com você, dando-me uma tapinha no rosto. Ela sorria estranha como se estivesse a muito ansiando essa visita triunfante.

A senhora conhecia todos os recantos da minha casa. Isso me assustava! Como ela podia saber disso? Olhou minha rede na varanda e disse: Quase me deitei nessa rede, porém você sempre foi hostil. Fique paralisado por um momento, eu hostil com uma senhora? Isso só podia ser mentira e das muito mal contadas. Ela foi contando histórias de cada recanto e passando sem hesitar. O mais surpreendente é que não mentia sobre nenhuma, cada narrativa era a mais pura verdade. Ela ainda as contava repetindo os trejeitos da Morena, até o perigoso sorriso-abraço ela tentou copiar. Os cacoetes soavam caricaturais se comparados aos reais, mas a ausência da real dona os deixava mais fiéis.

Vimos meu sofá, a cozinha, o escritório, o quarto de hospedes e, enfim, subimos ao primeiro andar e chegamos ao meu quarto, ainda impregnado pela presença da Morena. A senhora olhou-me rindo sarcasticamente e falou: Ora, vejam só. Quase morri para entrar na sua casa e hoje entro pela porta da frente, ganhando de bandeja o quarto principal, onde muitas mulheres quiçá chegaram. Ela me empurrou, tropecei na cama e caí deitado. O perfume da Morena preencheu o ambiente quando aterrissei nos lençóis quentes e enrugados. Nesse momento, reconheci a senhora, Saudade. Encomenda enviada com os comprimentos da Morena, eram esses os escritos presentes no cartão que a senhora me entregou.

Não consegui entender como a Saudade podia ter me batido tão forte e tão inesperadamente. Ainda tive um golpe de misericórdia, dois segundos depois do desaparecimento do carro da Morena na esquina, meu celular vibrara no bolso. Numa mensagem ela informava que um senhor muito jovem, bonito e cego a havia encontrado e se juntara a ela na viagem, trazendo de brinde um outro preguiçoso e vestido de cores mornas, que tentava copiar todos os meus cacoetes e trejeitos. Sorri e dei um beijo na senhora, que agora me olhava surpresa, minhas encomendas também haviam chegado.


VARCELLY





http://www.youtube.com/watch?v=hSR6UP9866c ( O clipe da música)

terça-feira, 21 de julho de 2009

Porta-retrato

Tenho na cômoda um porta-retrato a um bom tempo, totalmente, vazio e branco. Muitas fotos se propuseram a preenchê-lo, mas nenhuma alcançou tal intento. Não é que seja difícil entrar. No entanto, só há, inicialmente, um tamanho de foto cabível. Qual seria? O 3x4! Isso é um problema para algumas pessoas desejosas por pôsteres em toda a casa sem ao menos terem uma 3x4.

É um plano de carreira. A princípio, conhecer a pessoa, depois, possuir convívio capaz de gerar lembranças suficientes para o porta-retrato. Afinal, qual é a graça dele? A graça não é a foto, como muitos inexperientes pensam, e sim o mundo ou universo por trás dele. Os cacoetes que você sabia salteados, a textura da pele, o sorriso, o perfume, as palavras, os beijos, os aromas e outros. Então, não pense maldades ao ler que se faz necessária uma gama de lembranças suficientes para mandar a foto, mesmo a 3x4.

Finalizada essa etapa você tem direito a sua 3x4. Calma! Eu sei que os porta-retratos geralmente são 10x15. Como atingir a 10x15? Mantendo o trabalho criativo de memórias e bons momentos. Dessa forma, cada vez que eu precisar menos da porta-retrato para lembrar você maior será sua foto. E bingo, quando menos esperar, terá fotos de tamanho natural por toda a casa.

Qual seria a razão lógica disso? Quando as lembranças são passageiras e ainda pouco intensas é como se fossem um vídeo de baixa resolução, você até gosta e assisti, mas pouco tempo depois cansa. Elas têm dificuldade de manter sua atenção por um intervalo de tempo relevante. Com a evolução das experiências, o filme adquire uma resolução cada vez melhor, e desviar a atenção dele é que se torna difícil.

Qual é o último estágio? Ele é além das fotos pôsteres. Essas não são nada mais do que o fim do período apaixonado. Depois elas são deixadas de lado, por uma realidade totalmente envolvente. É um mundo 3D! Você é maior do que os pôsteres, maior do que os outdoors. Sua presença é tão forte que todos os objetos que anteriormente faziam menção a sua pessoa são desnecessários. Seu perfume se sobrepõe a todos os outros, sinto sua presença ao entrar no prédio estando no nono andar, reconheço sua voz nos trotes que tenta passar por mais que a tente disfarçar e o tempo parece adquirir humor variável com sua presença. Quanto está por perto ele corre desgovernado e dias somem em um piscar de olhos, mas se você se afasta ele fica moroso e em algumas vezes parece até retroceder.

Então, qual é a função de ter foto no porta-retrato? Rapaz, eu sinceramente não sei. Por que as pessoas se importam com isso se a presença de lembranças, realmente boas e importantes, torna o retrato desnecessário. Meu porta-retrato não está vazio por ausência de mulheres interessantes, mas porque existem apenas mulheres especiais. Essas que incluem desde amigas fantásticas a beijos deliciosos e bocas morenas e macias. Uma delas ficou até de me mandar uma encomenda desde que viajou, engraçado parece que já faz dias, no entanto, o relógio teima em mostrar que só foram minutos. Opa, alguém bateu na porta, só pode ser a Morena.


VARCELLY


quinta-feira, 16 de julho de 2009

Rewind

O lençol está no chão junto com as roupas
Respiramos ofegantes deitados lado a lado
Você rola da cama para o meu corpo
Minhas mãos abandonam a cama, encontram seu corpo
e das suas costas descem suavemente até o seu quadril,
onde se alocam firmemente
Suas mãos liberam o lençol,
a pressão entre nos é aliviada

Gritos.
Nossos gritos ecoam na casa vazia
Enquanto os corpos chocam-se intermitentemente,
os suspiros preenchem por completo nossas boca.
Nos beijamos

O lençol se agarra à ponta do meu pé
Rolamos para o meio da cama
e ele nos acompanha abandonando o chão

Você está por baixo
colamos nossos corpos e puxo seus cabelos
Minha boca percorre suas pernas,sua cintura e seu pescoço
subo suas roupas, abotoou sua calça, damos as mãos.
Ponho os pés nos chão em cima das minhas roupas
Você se senta, abaixa-se e me vesti enquanto se levanta

Sua boca encontra minha barriga,brinca no meu quadril
Minhas mãos chegam a seus cabelos
Você beija o meu tórax, abotoando minha camisa,
morde o meu pescoço, elogiando meu perfume, nos beijamos.

Você ergue os braços e lhe ajudo a vestir sua blusa
Beijo e mordo desde o seu ombro, recolhendo a alça da blusa,
até o começo da orelha, passando pelas bochechas e boca
Caminhamos até a porta entre risos e abraços
Você me beija e sai para o corredor

Trocamos comprimentos de boa noite
Eu olho assustado no momento que você sorri
Fecho a porta
Ouço uma batida na porta
Desloco-me até ela vagarosamente
Penso ser só mais uma noite chata sem surpresas
Sento no sofá
Ligo a tevê
Acabo de chegar em casa.


VARCELLY




http://www.youtube.com/watch?v=EqWLpTKBFcU( O clipe da música, que é ao contrário)

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Máquina do tempo

Opa, amigo, bom que chegou. Estava, nesse momento, rememorando algo engraçado que vem me acontecendo. Sei que vai parecer algo estúpido, mas começo a acreditar na idéia de máquina do tempo. O amigo ponderou a relevância daquela informação, no entanto, em consideração ao velho companheiro manteve o semblante de interesse. Afinal, depois que inventaram o teletransporte tudo ficou mais fácil para a viagem temporal, pois só faltava usar esse transporte no tempo. Para minha sorte, disse o senhor, pareço ter sido escolhido como usuário teste do sistema. Hei de lhe contar tudo em detalhes, que são necessários porque aparentemente existem efeitos colaterais.

Ontem estava lado a lado com meu filho, Thomas, e ele brincava tranquilamente dentre seus carrinhos. Os cabelos dele negro como de sempre, os dentes ainda em fase de mudança e os pés pequenos que se moviam como balas por toda casa. Muito agradável vê-lo sadio a brincar. De repente, estava sentado a me balançar na cadeira e o Thomas entrava pela porta da frente, maior, forte e já com cara de homem. Foi como um avanço de quinze anos num piscar de olhos. Calma, não argumente ainda. Tenho certeza que não estava sedado! Tenho, tenho sim! Sei que estou num hospital, só não entendo o porquê.Por que tanta certeza? Porque meu filho veio novamente ao meu encontro e ficou comigo o tempo todo que o médico esteve aqui.

Durante essas viagens temporais, meu corpo sofreu sérias avarias, estou velho, aparentemente, doente e preso no futuro aqui com você, amigo que o nome me foge agora. Desconheço o método que os cientistas utilizam para me fazer viajar no tempo, não os vejo em canto nenhum, tudo parece tão real e, por fim, até meu corpo se altera. Inclusive, essa nossa conversa já pode estar acontecendo de novo ou não, de acordo com a vontade dos cientistas.

Sim, o envelhecimento e o esquecimento são alguns dos distúrbios que comentei no começo. Todavia, existe outro bem pior, quando avanço no tempo as cores do mundo parecem bem mais fracas e as imagens mais fugazes. É como se fosse uma projeção com interferências, na qual há chuviscos, mas ainda se pode captar algo da imagem. O Thomas, por exemplo, é completamente colorido na atualidade, brincando com seus carrinhos, porém no futuro, não. Ele já se apresenta mais pálido (cabelos brancos, alto) assim como o ambiente também. É difícil falar desse futuro porque, como disse, as interferências e as inconstâncias dificultam o armazenamento dos fatos.

O senhor adormece e no dia seguinte, ainda preso no futuro, assustou-se com a entrada de um completo estranho no quarto, que aparentemente o conhecia muito bem. O estranho não era enfermeiro, nem do hospital, pois não vestia identificações, estava humildemente composto. O sujeito sentou-se na borda da cama, o senhor afastou-se contrariado pensando “O que esse homem quer vindo sentar-se tão perto de mim?”.

- Senhor? Não se assuste.
- Como assim não se assuste? Quem é você? E ainda mais como se atreve a sentar tão perto de mim?
- Senhor, sou o Thomas, seu filho.
- Mentira! O Thomas não está velho. Há dois dias atrás ele brincava de carrinho na sala. E afinal, como vim para aqui? Pessoas só entram e saem, no entanto, ninguém me explica a real razão disso. Diga aos cientistas que não quero mais essas experiências! Quero minha simples vida com o Thomas brincando de carrinho em casa de volta.

Em seguida o senhor sussurra olhando para alguns pontos distantes do quarto “Acho que o avanço temporal dessa fez foi muito grande, posso até estar num universo paralelo...”. Mas é subitamente interrompido pelo estranho.

- Pai!
- Que pai? Eu não sou seu pai e você não é o Thomas!
- Não tem máquina do tempo pai.
- Você sabe da máquina? Você os conhece?
- Pai não existe máquina!
- E como estou aqui conversando com um estranho se minhas lembranças mais fortes são as de dois dias atrás com Thomas na sala?
- Você está com Alzheimer pai e se passaram trinta anos desde minhas brincadeiras na sala.



VARCELLY

ps: alguns filmes parecem com esse texto. São eles Diário de uma paixão; Efeito Borboleta e Camisa de força (The jacket)





quinta-feira, 9 de julho de 2009

Travessia II

Um dia organizei tudo o que era seu
Tudo aquilo que me trazia memórias suas
e ainda se encontrava em minha casa
Fotos, cartas, roupas, ursos de pelúcia...
Coloquei numa caixa e bati na sua porta
Deixando a caixa próxima à porta,
saí antes que chegasse

Voltei pra casa,
mas, meu quarto ainda era o mesmo
Depois de tirar tudo que fazia alusão a você
Percebi que você ainda estava ali
Encostada no único objeto refletido no espelho
Eu

Percebi então,
que você nunca deixaria de fazer parte de mim
perto ou distante
Coloquei-me no colo e adormeci

"Chego a ter medo do futuro
E da solidão, que em minha porta bate...
e na parede do meu quarto ainda está o seu retrato...
pensei até em me mudar"

VARCELLY


terça-feira, 7 de julho de 2009

Relatos de Mi

Era uma noite agradável, a brisa corria e tornava todo e qualquer ambiente mais aconchegante, eu havia me arrumado toda para ele, na verdade, seria o primeiro encontro. Tudo parecia perfeito. Eu iria o esperar numa sala pequena e climatizada bem próxima a minha casa, algo como uma recepção. Antes de sair mais uma encarada demorada no espelho para os últimos arranjos, verifiquei se todas as linhas estavam no lugar, enquanto ressoava alegria. Só então, dirigi-me ao local marcado.

O caminho não foi longo, pois durante o trajeto vim relembrando canções, sambas antigos e modinhas, todas aparentemente oriundas das vibrações do meu espírito feliz, e quando menos esperava cheguei. Tudo era confortável, organizado, até climatizado era. A brisa da noite serena ficou do lado de fora, mas confiei que o encontro a traria de volta. Confiança essa abalada pela presença de outros tantas meninas na mesma sala. Elas pareciam tão arrumadas quanto eu, algumas mais magras e alvinhas e outras assim como eu loiras. Foi horrível!

Senti-me usada. Que homem poderia ter uma atitude desse tipo? Iludir um grupo de garotas mandando-as esperá-lo num mesmo recinto e ainda permitir que se vissem. Em poucos segundos, todas estávamos revoltadas. Eu tentei apaziguar a situação dizendo que o deixaríamos na mão em plena roda de samba, ou seja, partiríamos no auge do seu melhor choro. Todas aceitaram a idéia e eu já estava tranqüila quando uma nova onda de ira me possuiu, minha irmã adentrou o recinto.

Michele era muito mais nova e bonita do que eu, assim como a maioria das garotas ali, mas era especial. Detentora de um timbre de voz maravilhoso que conquistava todos até mesmo quando conversava. Eu quase desmaio ao vê-la. As meninas me ajudaram em grupo, já que a diferença de peso entre nos era relevante, e eu me pus de pé. Michele correu em minha direção para ajudar-me também e eu lhe contei o acontecido. Ela não parecia acreditar no que ouvia e sem esforço, meu e das outras meninas, juntou-se a nós.

A porta então se abriu e ele entrou. Sapatos brancos, terno aberto de linho branco, camisa rosa suave e um chapéu levemente caído sobre o rosto. Todas ficaram tensas até que ele vestiu o sorriso. Foi como uma amnésia instantânea para tudo que tínhamos passado. Desde a humilhação até o encontro grupal, toda ira escorreu pela ponta do arco do sorriso dele. Ele chamou uma a uma de nós para fora da sala, alisou o corpo de todas, demorando as mãos em cada recanto, nos fazendo esticar e esticar a seu bel prazer, até que ficássemos presas por suas carícias. E assim, ficaram as revolucionárias deitadas lado a lado e presas pelo carinho das mãos dele. Acho que ele sabia da relação de parentesco entre eu e Michele, pois a colocou o mais longe possível de mim.

Depois de se aproveitar de cada uma de nós, ele nos levou de volta à brisa noturna e nos apresentou orgulhoso aos amigos na roda de samba. Então, recomeçaram as humilhações. Ele nos tocava ao mesmo tempo, empurrando duas ou três de nós para uma mesma casa e lá nos acariciava simultaneamente, depois nos tocava todas ao mesmo tempo, mas, o fazia com tal maestria que não nos exaltávamos mais e aproveitávamos à brincadeira. Chegou ainda a oferecer nossos serviços a diversos amigos. Não tínhamos pudor algum a essa altura. Minha mãe me avisara para tomar cuidado com malandros, eles são tão agradáveis que seus defeitos se tornam imperceptíveis. Ficávamos todas nas mãos dele e adorávamos isso. A princípio, unidas pela fascinação da presença dele, depois pelo ódio e agora pelo amor. Ele parecia saber até onde cada uma de nós ia e nos coordenava muito bem, tirando proveito de tudo e, por diversas vezes, deixando-se aparentar subjugado à nossa vontade.

Eu e minha irmã estamos bem. Inclusive, já estivemos juntas com ele várias noites e foi maravilhoso. Sabe como é não é? Vida de corda de violão é difícil.


"minha viola vai pra o fundo do baú.
Não haverá mais ilusão
Quero esquecer e ela não deixa
alguém que só me fez ingratidão"


Ps: Hauahuah Posso pedir um favor? Lê de novo para perceber o amor do rapaz por seu violão.
Ps: Nesse link estão algumas explicações para o texto. São basicamente sobre a estrutura do violão. Os trechos interessantes são as partes do violão e a afinação básica, que explica o caso das irmãs.


VARCELLY



quinta-feira, 2 de julho de 2009

Larga rede dos desejos

Grande e larga para casais
Suspensa
A rede suporta meus sonhos
Queria tua presença ampliando as curvas dessa,
teu cheiro suspendendo meu respirar,
que estivesses ao alcance dos meus olhos e dedos
pra que no tão sonhado beijo pudesses me ressuscitar

O último encontro se foi
deixando muito mais do que saudades
O lençol ainda está quente
O teu cheiro aflora dele,
assim como, de todos os recantos da casa

Ainda estou deitado da maneira que me deixou
Não cogitei banhar-me
Nunca me perdoaria se perdesse
todos os beijos escritos em meu corpo

O sol do meio dia chegou
Sinto não ter desperdiçado nenhum segundo
mantendo-me ainda deitado
Devo sentir cada momento
Não sei se haverá uma próxima vez
Adormeço

Tu chegas suave,
flutuando em minha direção
Acaricias meu rosto,
passas a mão em meus cabelos,
inundas novamente o cômodo

Levantas o lençol
Curvas a rede

Estamos juntos de novo.

" E eu que era triste
Descrente desse mundo
Ao encontar você
Eu conheci o que é felicidade
Meu amor"


VARCELLY